terça-feira, 13 de setembro de 2011

sociedades amazonicas e desenvolvimento sustentavel.

Rede de parcerias e modelo socioambiental – “Imensas transformações vêm ocorrendo na Amazônia brasileira desde as últimas décadas do século XX, mas nem sempre são percebidas ou o são de modo variado, segundo interesses de diferentes atores”, ressalta Bertha Becker, professora Emérita da Universidade Federal do Rio de Janeiro, departamento de Geografia e coordenadora do Laboratório de Gestão do Território - LAGET/UFRJ, membro da Academia Brasileira de Ciências, Doutora "Honoris Causa" pela Universidade de Lyon III e Consultora do Instituto Nacional Ciência e Tecnologia - INCT Biodiversidade e Uso da Terra na Amazônia, coordenado pela ecológa Ima Vieira (Museu Goeldi).

Bertha destacou no artigo Rede de Parcerias e modelo socioambientala investigação de experimentos sustentáveis de pequena escala como elemento inovador no processo de transformação regional, a que atribuiu à denominação genérica de modelo socioambiental. “São inúmeros e valiosos os estudos sobre esses experimentos alternativos por pesquisadores de diversas áreas das ciências sociais, mas não há ainda um conhecimento sistemático sobre as condições que possibilitam sua formação e sua sustentação”.

A gestão do modelo socioambiental é uma inovação regional do final dos anos oitenta e noventa. As lutas sociais de coletividades em defesa de suas terras e identidades trouxeram novas realidades que foram cruciais nas mudanças estruturais para a sociedade civil tais como a conectividade e a mobilidade rural-urbana da população. O movimento social foi reforçado pelo processo de globalização que incidiu fortemente na região através da cooperação internacional.

A autora ressalta a importância de se reconhecer o modelo socioambiental “não como solução geral para o desenvolvimento regional, nem como um corpo estranho, mas sim como uma inovação amazônica cujo isolamento deve ser rompido mediante sua articulação com as políticas públicas federais, regionais e estaduais”.

Para Bertha o sucesso desse modelo socioambiental para a Amazônia depende do sucesso político. “Uma significativa ação política governamental em várias dimensões é necessária para sua continuidade e seu sucesso, alcançando o mercado em condições competitivas”.

Visão de Fronteira – O trapézio amazônico, área situada nas fronteiras do Brasil, Colômbia e do Peru é outro tema tratado em artigo publicado no livro Desenvolvimento Sustentável e Sociedades na Amazônia. Os yaguas, sociedade indígena encontrada no nordeste do Peru, protagonizou durante aproximadamente 30 anos deslocamentos que conduziu o grupo até as fronteiras da Colômbia e do Brasil.

Jean-Pierre Chaumeil, etnólogo da Centre National de La Recherche Scientifique (CNRS), destaca no artigo Visão de Fronteira: o caso do trapézio amazônico numerosos grupos ocupantes de territórios bi ou trinacionais. A pesquisa avalia em que medida essa área, que pertence a grupos geopolíticos diferentes, constitui um local ou um espaço integrado.

A designação de trapézio amazônico diz respeito “a uma faixa estreita de terra, em forma de trapézio, que liga o extremo sul da Colômbia à Amazônia”. Hoje, a região engloba territórios adjacentes do Peru e do Brasil. “Lá encontram-se seis grupos indígenas (ticunas, Cocamar, yaguas e witotos em particular), mestiços e migrantes andinos, aos quais somam-se diversos setores e representantes de sociedades nacionais e internacionais”, lembra Chaumeil.

A atividade econômica dessa região é baseada no extrativismo e numa economia de subsistência. Jean-Pierre Chaumeil destaca que a economia local caminha para outras vertentes. “Se o setor industrial por sua vez é pouco desenvolvido, as atividades ligadas ao contrabando e ao narcotráfico estão, em contrapartida, em plena progressão nessa linha de fronteiras e absorvem uma forte porcentagem da mão-de-obra regional”.

Conflitos, alianças e recomposições territoriais – Entre os projetos, o livro apresenta o trabalho de Pascale de Robert, pesquisadora associada à Coordenação de Ciências Humanas do Museu Goeldi.Conflitos, alianças e recomposições territoriais em projetos de desenvolvimento sustentável: experiências da terra indígena Kayapó (Sul do Pará) se concentra na análise das diversas formas de manejo dos recursos naturais, existentes no entorno dos territórios indígenas.

O sul do Pará possui um contraste marcante em locais dominados por pastagens e outras cobertas por florestas. No texto de Pascale, a pesquisadora lembra a história recente da Amazônia. “É nas suas interfaces, ou seja, nos espaços geográficos e sociais onde se encontram reunidos os principais protagonistas dos distintos modelos de desenvolvimento, que alguns paradoxos se revelam com maior intensidade. É também nesses espaços que se concentra atualmente grande parte das atividades ilegais e dos conflitos graves, como mostram os recentes acontecimentos na Terra do Meio”.

Os Kayapó, por outro lado, “tem conseguido manter uma posição de relevo na luta etnossocioambiental”, diz a pesquisadora. Experiências inovadoras em projetos de desenvolvimento sustentável (manejo florestal, produção de óleo de castanha, conservação,...) foram elaboradas para algumas aldeias específicas inseridas numa rede de parceria internacional.

Mesmo que por um período os Mebengôkrê, como se autodenominam os Kayapó, tenham sido apontados como participantes de práticas regionais predatórias como o garimpo e a exploração ilegal de madeira, a terra indígena conseguiu “se manter como uma ilha de floresta numa das regiões do país mais afetada pelo desflorestamento”.

A autora revela a luta dos Kayapó em garantir autonomia. “Os Mebengôkrê conservam vivas suas instituições políticas que garantem autonomia a cada aldeia, mas mostram também a capacidade de superar dissensões internas frente às ameaças do ‘mundo dos brancos’, identificado com o modelo desenvolvimentista”.

Texto: Silvia de Souza Leão


Nicolas Poussin (1594-1665)
Da Ordem
Óleo sobre tela - 95,5 x 121 cm
Fort Worth, Kimbell Art Museum

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